sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Texto sobre 'El rey se muere', no blog do Em Cena


Hello, people!

O texto abaixo, sobre o espetáculo 'El rey se muere', foi escrito por nossa diretora, Desirée Pessoa, para o blog do Poa em Cena. Segue então, na íntegra:

Com o Rei, morre uma oportunidade

Num cenário com clima onírico se desenvolve a trama de El rey se muere, espetáculo uruguaio criado a partir do texto de Eugène Ionesco, no qual o personagem central (rei Berenguer) tem seu encontro com a morte marcado desde o início da peça.
Elementos cênicos cujos materiais são leves e claros nos remetem imediatamente a um tempo passado, no qual o contato com o onírico era entendido frequentemente como um acesso do homem a uma dimensão desconhecida e, mesmo, próxima do divino. Daí, creio, seja proveniente a escolha deste ambiente para a ocasião de tratar deste tão caro tema ao ser humano que é o da morte.
Com um elenco notavelmente experimentado, o espetáculo tem marcações precisas e soluções de cena bastante funcionais.


A velocidade sempre ágil da encenação é sustentada de forma competente pelos seis atores, desde a abertura da peça – constituída pela apresentação do rei Berenguer. A decisão por este ritmo que se constrói sob o olhar do espectador foi tomada, ao que pude observar, na busca pelo tempo da comédia de Ionesco. Esta, por sinal, é composta por uma estrutura muito particular. Considero o humor do autor romeno tão específico quanto difícil de ser alcançado e executado com primor. O absurdo de suas comédias precisa ser procurado nos detalhes. O texto sinaliza aos criadores, muitas vezes, por uma linguagem metafórica aquilo que poderá ser aproveitado em cena, e se faz necessário estarmos atentos às suas indicações.
Um dos principais traços da obra de Ionesco é a proposta de levar os personagens e cenas a extremos. E é aí que, em minha opinião, El rey se muere do grupo uruguaio deixa um pouco a desejar. As atuações são um misto dos estilos farsesco, naturalista e melodramático. Porém, falta brilho (na falta de palavra melhor) no desempenho – e nos olhos – dos atores. Talvez isto tenha ocorrido apenas na ocasião em que assisti, por se tratar de uma apresentação em uma noite extremamente chuvosa, com um público que não preenchia a lotação do teatro. Nunca saberei, pois eis a tão complexa fatalidade do teatro, com a qual todos nós, que a este ofício nos dedicamos, temos de lidar: ele existe de forma única a cada noite. O que passou não se resgatará jamais. Por isso não tenho como afirmar se o aparente desânimo em alguns momentos dos atores se deve às condições singulares da noite em que presenciei a obra uruguaia. O fato é que, durante a encenação, tive a sensação de que a escolha pelo exagero, condizente com o texto original, não chegou a se concretizar em alguns momentos. Existe uma proposta de busca pelos extremos a cada cena, mas por vezes não atinge seu grau máximo. As marcações são muito bem executadas pelos atores, mas nem sempre o jogo acontece. As cenas não apresentam grandes surpresas de uma para a outra, então não vi também evolução na encenação.
O conflito cênico se estabelece a partir da evidência da morte do rei: este já não tem direito ao seu poder e não consegue se conformar. Neste personagem aparecem questões humanas de grande valor, e nisto consiste um dos dois maiores méritos do espetáculo: a validade de seu tema. A ruína, a caminhada rumo ao fim e o desejo de deixar um legado são abordados de forma comovente em alguns momentos. Da rainha à empregada, todos acusam Berenguer de suas injustiças enquanto governou. Em instantes já o estão tratando com glórias demasiadas (muitas delas nem mesmo verdadeiras dentro da ficção estabelecida), devido à hipocrisia que socialmente prevalece frente à morte de alguém. Enquanto isso, o moribundo pergunta à sua corte (e em verdade não querendo enfrentar a crueldade da resposta): “Por quanto tempo vão lembrar-se de mim?”. Complexa e comovente abordagem.
O segundo (e fundamental) mérito do espetáculo é o momento em que, sob meu ponto de vista, o acontecimento teatral atinge seu ápice na encenação criada. O ponto alto do espetáculo é a reflexão sobre o fardo do poder, significativamente trabalhada pelas palavras “isto não és tu”, tão bem ditas por Carla Moscatelli a Roberto Bornes. É neste momento em que o discurso aborda questões como imagem e máscaras que se vê o teatro que a atriz sabe fazer com excelência: até sua respiração consegue nos comover.
Paradoxalmente, a cena mais forte é exatamente o ponto mais frágil da encenação, pois é aí que percebemos que talvez a decisão inicial possa ter sido equivocada. O teatro que a grande atriz sabe fazer de melhor é outro, que não o estilo de peça adotado pela trupe. Anne Bogart diz que a escolha é sempre um ato de violência, no teatro. Afirma, no entanto, que esse ato violento é uma condição necessária para todos os artistas. Fico pensando, após assistir El rey se muere, o quanto, por vezes, sem consciência, mergulhados em nossos processos, somos fragilizados por nossa própria sensibilidade artística. Naquele que considero o melhor momento desta peça, ela nos revela a oportunidade que perdemos de assistir uma montagem de excelência, não fosse a escolha feita.
Simbolicamente, o grande clímax do espetáculo é justamente neste estilo tão diverso daquele em que o todo se desenvolve: quando o rei se vê abandonado por todos, é a primeira esposa a única que o acompanha no fatídico momento. Com a mão estendida, é ela que o conduz à morte. É o momento mais intimista desta obra. O silêncio eleva a plateia e a suspende. Há apenas uma luz recortada. O restante do palco, todo o tempo muito iluminado, agora é invadido por uma escuridão sombria. Aprecio este momento, especialmente, e volto satisfeita para casa.

*Desirée Pessoa é diretora de teatro e atriz. 
Diretora do Grupo Neelic e mestre em Artes Cênicas pela UFRGS

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Um pouco de Caravaggio



Gente, matéria sobre Caravaggio, que queremos compartilhar com vocês, pois achamos bem rica:



Na pintura A Conversão de São Paulo, uma encomenda para a igreja romana Santa Maria del Popolo, finalizada em 1605, um imenso cavalo se impõe como o elemento principal na tela diante do santo caído ao solo, os braços estendidos para o animal. Um incidente raio de luz estabelece contrastes de claro-escuro num cenário desprovido de Deus, de anjos ou de paisagem. Estupefato pela profanidade do quadro, um prelado local interpelou o autor: “Por que você colocou o cavalo no meio e são Paulo no chão? Este cavalo é Deus?” O artista respondeu: “Não, mas ele está na luz de Deus”.


A Conversão de São Paulo



A divindade geradora da luminosidade pictórica, nesse caso, nasceu de parto natural em 1571, em Milão, batizado de Michelangelo Merisi, mais conhecido como Caravaggio. Suas obras são exibidas pela primeira vez no Brasil: em maio estiveram em Belo Horizonte, na Casa Fiat de Cultura, e chegam agora ao Museu de Arte de São Paulo, o Masp, em São Paulo. A tela acima mencionada, ainda hoje exposta na capela em que foi instalada, é apenas uma das ilustrações de sua genialidade. O pintor levou ao extremo a evolução do chamado chiaroscuro, técnica convertida no DNA de sua produção ao longo da breve carreira – abruptamente encerrada por uma febre alta em 1610, aos 39 anos, quando estava já condenado à morte por envolvimento em diversos delitos – e inspiradora de mestres como o holandês Rembrandt (1606-1669). A forte oposição entre luz, sombras e penumbras, usada de forma sistemática, aliada ao realismo manifesto, constituiu a marca de sua plasticidade, em íntima relação com uma linguagem dramática. Na prática, o artista pintava em ambientes sombrios, com modelos e objetos mergulhados na obscuridade, aclarados por uma única fonte de luz vertical procedente do alto, formando um tipo de cave iluminada por um respiradouro. Isso resulta na abolição da luminosidade “universal”, comum até então, e na irradiação de uma luz dirigida e precisa, geralmente originada do canto superior esquerdo da moldura.

Caravaggio também teria feito uso de um sistema de câmera escura, com lentes e espelhos para a projeção das imagens sobre as telas, estimulado pelo filósofo e cientista Giovanni Battista della Porta, autor de A Magia Natural (1558), hipótese sustentada pelo artista britânico David Hockney. O crítico de arte francês Manuel Jover, um estudioso de Caravaggio, endossa: “Os historiadores estão cada vez mais convencidos disso. Mas ele não é o único e nem foi o primeiro. Já era uma prática em Leonardo da Vinci (1452-1519) e, provavelmente, nos pintores primitivos flamengos. Caravaggio se serviu desse expediente para acentuar a semelhança com a realidade na superfície dos objetos e dos corpos e também para ajudá-lo na reconstituição da cenografia”.


Medusa Murtola (1597)
Limbo

O fotógrafo e diretor norte-americano David LaChapelle defende que Caravaggio montava suas pinturas como fotografias. “Foi um fotógrafo antes da fotografia”, definiu certa vez. Já o cineasta norte-americano Martin Scorsese acredita que o pintor “teria sido, sem dúvida, um grande diretor de cinema”. Como exemplo, citou a própria A Conversão de São Paulo: “Ele escolhe um momento, não o absoluto do início da ação, e o espectador se vê imerso na cena. Funciona como uma mise-en-scène em um filme: poderoso e direto”. Mas nem sempre foi assim. Caravaggio permaneceu em uma espécie de limbo artístico até ser recuperado no início do século 20. O famoso historiador de arte italiano Roberto Longhi é considerado o maior responsável por essa redescoberta do pintor para o mundo, a quem apelidou de “mestre das trevas”. Segundo Longhi, Caravaggio colocou “em circulação a pintura mais revolucionária, talvez, de toda a história da arte sagrada”. Em sua definição, o claro-escuro caravaggista é um “fotograma poético”.

A recuperação do prestígio de Caravaggio deu-se no período em que a fotografia e o cinema ampliaram suas ambições artísticas. Para o crítico Manuel Jover, a coincidência é mais sutil do que determinante. “Não diria que ele é um precursor da fotografia, mas suas preocupações revelam que há uma relação: o fato de querer representar um instante preciso do drama, como se fosse um congelamento da imagem. Ele parava a ação em seu instante mais dramático, significativo e intenso.”

As razões para o seu temporário esquecimento estão, de acordo com os especialistas, em sua rejeição e seu menosprezo pelo academicismo reinante. Sua abordagem, contraditória com a era do classicismo, da antiguidade e com os nobres capítulos da mitologia, era condenada pelo sistema dominante na Europa. Caravaggio recorria ao homem da rua, a prostitutas, enfim, a um casting popular para servir de modelo em suas composições de temas sagrados. Uma das principais amostras dessa heresia é A Morte da Virgem, de 1605-1606, motivo de escândalo na época pela representação mundana da Virgem sagrada, o ventre inflado, inspirada na imagem de uma prostituta morta afogada e resgatada do rio.


Realismo e teatralidade

Ainda na questão do método propriamente dito, acredita-se que Caravaggio se distingue da grande maioria de seus contemporâneos por não adotar o desenho prévio às pinceladas na tela, o que influi diretamente no produto final (no início de julho especialistas italianos anunciaram a descoberta de uma centena de desenhos que o artista poderia ter realizado na juventude, mas nada foi confirmado ainda). Todas as decisões relacionadas à obra – o volume, a luz, as cores, a matéria, a composição – eram feitas em uma só ação. “Isso explica também um pouco da intensidade representativa e subjetiva”, acrescenta Jover.

O realismo e a teatralidade de suas telas, contraditórios e complementares, expressados no vigor de seu claro-escuro, confundem-se com sua turbulenta vida pessoal, caracterizada por violência e impulsividade. Arruaceiro, excessivo, Caravaggio amargou muitas prisões e, em 1606, tornou-se um fugitivo, condenado à pena capital após ter ferido de morte com uma espada o nobre Ranuccio Tomassoni, em uma disputa por causa de um jogo. Como analisa Manuel Jover: “Sua pintura nasce também dessa vivência trágica. Seu marcado claro-escuro, brutal e violento, contribui para a dramatização de sua pintura, que contém os aspectos contrastados, tenebrosos, de sua existência. O que dizer do quadro David e Golias (1609-1610), em que David segura a cabeça de Golias com um olhar incrível de carinho para a sua vítima? Ainda mais quando se sabe que a cabeça de Golias é um autorretrato de um homem perseguido, condenado à morte?” .

Texto de Fernando Eichenberg, correspondente do jornal O Globo em Paris, encontrado no site da revista Bravo: http://bravonline.abril.com.br.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

19 de setembro - dia do teatro


Gente, o texto abaixo foi postado no Facebook pelo perfil Dona Heliodora (um personagem de ficção criado por Felipe Barenco), em virtude de hoje ser o dia do teatro. Achamos muito pertinente e resolvemos divulgá-lo aqui, pois sabemos que tem pessoas que não usam o Facebook, e achamos que este texto deve ser lido pelo maior número de artistas e apreciadores da arte possível.

Abraços!



"O DOGMA DO MERDA.

Prezados atores e dramaturgos; prezados profissionais do teatro:

Não vamos mais pedir esmola. Este é um relato de como se encontra o teatro carioca em 2012 e não coloco a culpa no governo, na TV nem nos empresários. A culpa, desconfio e lamento, é do próprio “povo do teatro”. E não
 estou falando da culpa cristã, essa que promete um Salvador e o caminho dos céus, eu me refiro a sua responsabilidade como artista pelos rumos da sua profissão.

Era uma vez um povo que se acostumou a trabalhar de graça, a viver de favor, a ser submisso. Um povo que foi domesticado a receber sempre com muita gratidão e humildade um apoio, o prato de comida na noite de estreia, um desconto camarada durante a temporada. Infelizmente, esse povo que trabalha (e muito!), se acostumou a se nivelar por baixo.

Era uma vez um povo crítico, observador, treinado a perceber cores na realidade que escapam aos olhos da maioria de seus irmãos. Esse povo, com antenas conectadas naquilo que parece imperceptível, e capaz de produzir questionamentos sobre nosso jeito de ser e de se comportar, esse povo então batizado como “artista”, é muito conformado.

Era uma vez um monte de gente jovem, com seus vinte e poucos anos, trinta e poucas primaveras de sonhos, utopias e necessidades de transformar o mundo. Essa é a história de um povo criativo, bastante egocêntrico mas muito criativo, que nasceu inspirado a interpretar nossa existência e mostrar para o restante do “povo comum” que nas entrelinhas da vida existe drama, existe fantasia e que o nosso combustível para viver é o conflito.

Gostaria de contar para vocês a história de um povo apaixonado pelo que faz. Que tem dificuldade em enxergar na própria profissão um trabalho, que sobe no palco pela primeira vez cheio de ideologias e discursos prontos, que se sente ofendido e muitas vezes surpreso quando é pago pelo que faz. Pelo que ele faz muito bem.

É a fábula de um povo muito bacana e gentil que não deixa de prestigiar os amigos. De um povo que lota todos os teatros e que mesmo sabendo das dificuldades em se levantar um espetáculo, criou o “convite amigo”. Para que ele próprio, o “povo do teatro”, não reconheça o valor de seu trabalho. Ou para que não enfrente o pior dos pesadelos: uma plateia vazia.

O povo do teatro quer trabalhar a todo custo. Alega que é movido pela paixão. Trabalha não por compulsão ou doença, mas por uma necessidade política muito fundamental do ser humano: a vontade incontrolável de falar. De compartilhar. De perguntar sem a obrigação de responder. Alguns consideram-se mais especiais que os outros e ao invés da generosidade, disseminam vaidade. Outros, por não se sentirem tão importantes assim, por falta de possibilidade, desistem no meio do caminho. E desistir, meus caros amigos, não é vergonha. Não se deixem levar por discursos românticos de que o verdadeiro artista, o verdadeiro ator, não pode desistir de sua profissão. Não somos escravos do teatro.

Quantos de vocês não conhecem alguém que ficou para trás? Quantos de nós já não pensamos em desistir? Quantos talentos promissores não foram desperdiçados, quantas possibilidades não foram devastadas pela nossa falta de postura e união? Quantas almas criativas não foram enterradas diante da desesperadora e justa necessidade de chegarmos aos 30, 35 anos com um pouquinho de qualidade de vida?

O povo do teatro é um povo muito covarde. Covarde porque ele aceita qualquer coisa, porque ele se acostumou a produzir com o medo de não fechar as portas, de não perder os contatos, de não “se queimar”. Covarde por aceitar que empresas patrocinem seu trabalho como se fizessem um favor.

Infelizmente, os maiores sacrificados são os próprios artistas. Mesmo quando alguns poucos são beneficiados com o sonho do patrocínio, descobre-se que aquela empresa que fez o favor de “dar o dinheiro para bancar o seu sonho” vai depositar a parcela tão batalhada… um mês depois da sua estreia!

Os atores, a ALMA de qualquer espetáculo, e que exceto o público são a única presença verdadeiramente indispensável para que o teatro aconteça, são os últimos a receber. Os dramaturgos, os primeiros a trabalhar sem a menor garantia que um dia verão o seu texto encenado. A culpa não é dos produtores. Inclusive, eles trabalharão horas a fio para inscrever seu projeto na lei, para captar alguma grana por fora, para convencer o empresário que "aquilo é bom".

Só que estamos caminhando para o colapso. Quando qualquer classe de trabalhadores se sente agredida e desrespeitada, busca-se uma articulação, algum tipo de união e debate, alguma atitude. Os funcionários fazem greve. Assistimos, em poucas semanas, a greve de funcionários da cultura, a greve de professores, a greve de funcionários dos Correios e agora a greve de bancários
E os artistas, como se defendem? Como esse povo que é apaixonado pelo que faz entrará em greve com o amor? Vocês serão capazes de paralisar essa energia movida pela paixão, tão cafona, tão vítima e tão melodramática, para assumir o verdadeiro papel de heróis? Serão capazes de se transformar ao longo da jornada?

Queremos ser heróis trágicos, vítimas massacradas por escolhas infelizes e por uma batalha desigual com os deuses. Nossa maior desmedida não é o engano; nosso erro trágico é passar por cima e fingir que essas são as regras do jogo. Que é melhor jogar calado do que desistir. Já que para cada um que não trabalha de graça, uma centena trabalhará.

Vou apresentar a vocês o “povo da música”. Dizem que eles só entram no processo quando existe dinheiro. Assim como o “povo da técnica”, aquele responsável por operar o som que embala os atores ou a luz que não os deixará no escuro. O povo da música, quando trabalha de graça, exige no mínimo um instrumento para ser tocado. Os atores não. Eles aceitam ensaiar sem espaço adequado, aceitam ensaiar sem os objetos de cena, os atores aceitam não receber. Os atores aceitam. Aceitarão, no futuro, as indicações de alguns diretores despropositados que não sabem o que estão fazendo. Aceitarão o patrocínio que entra com meses de atraso. Aceitarão qualquer trabalho em qualquer constrangedor programa de TV para que possam pagar as suas contas no final do mês. E fazer o seu teatro, graça a Deus.

Os cenógrafos serão obrigados a fazer um cenário que caiba numa mala, os figurinistas terão que operar milagres em algum brechó da cidade, os iluminadores terão que ser inventivos usando velas, lanternas e um abajour e todo aquele montante do patrocínio vai pagar o banner, a assessoria de imprensa e sua estreia se resumirá a uma estética que impera no teatro carioca: palco vazio e um banquinho de madeira. Como é que um espetáculo que recebe 200 mil estreia assim? O dinheiro é destinado a pagar os profissionais. E pagar mal. O orçamento fica apertado e sobra muito pouco para o projeto em si. Nosso teatro se resume a uma mala, com toda a ironia que a palavra carrega.

Quantos artistas anônimos transbordando de talento, mas cheios de falta de sorte ou sem os devidos contatos, não morrerão sem viver o calor de uma temporada cheia?

Povo do teatro! Não vamos aceitar quietos e sermos pagos três meses depois! Aceitar é um verbo antiteatral por princípio. É um verbo que acaba com o conflito. E o que percebemos, angustiados com o povo do teatro, é que temos aceitado tudo com medo, com receio de não trabalhar mais. Não vamos trocar nosso trabalho por um prato de comida nem por um pedaço de pano. Não vamos nos deixar levar pela promessa de pagar nossas contas de janeiro apenas em abril. Ou então, prezado povo do teatro, vamos assumir que somos apaixonados e medíocres.

Por falta de união e por pura preguiça, nos tornamos invejosos e recalcados com quem trabalha na TV. Nos tornamos uma classe desesperada que perdeu a classe, que perdeu a fineza de se colocar de igual pra igual com um patrocinador.

Quando se é jovem, quando não se é ninguém, é muito bom desfrutar da importância de ser “desimportante”. De não levar os discursos tão à sério e enxergar por trás de um manifesto apaixonado e radical, cheio de inconsequências e desmedidas, um suspiro de sinceridade. E carinho, muito carinho, com esse tal “povo do teatro”. Afinal, se nem todos são do teatro, todos nós somos o povo.

Assumir esse desconforto não é uma maneira de dizer que o teatro faliu. Não é um manifesto pessimista. Não é apologia ao “não vale a pena”. É só a história do único povo do mundo que passa fome para alimentar a alma dos outros. Nunca foi tão emblemático gritar “Merda” antes de cada apresentação, mas no pé que estamos, sugiro que o grito seja dado no final, sempre que a plateia estiver vazia.

O povo do teatro enfrenta seu maior desafio. Já que ele não é pago pelo que faz, ficou refém do elogio."

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Dona Heliodora é um personagem de ficção criado por Felipe Barenco e este manisfesto não tem qualquer relação verídica com a opinião da célebre crítica Barbara Heliodora - por quem o autor tem profundo respeito e admiração. Por favor, não reproduza este texto sem os devidos créditos e esclarecimentos.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Curso "Um Estudo Sobre Nelson Rodrigues"


Gente,

Segue divulgação de um curso super bacana que criamos no Neelic.
Contamos com tua participação!


Um Estudo Sobre Nelson Rodrigues

Curso específico para pessoas interessadas em estudar, nos âmbitos da 
teoria e da prática, o clássico e polêmico autor da dramaturgia brasileira Nelson Rodrigues.  


PÚBLICO-ALVO:
Todos os interessados a partir dos 18 (dezoito) anos, com ou sem experiência em teatro.

METODOLOGIA:
O curso é composto de 12 (doze) meses de aulas práticas, teóricas e  seminários,
e uma montagem  de espetáculo ao final aberto a público e amplamente divulgado
na imprensa de grande circulação impressa e virtual, e a participação nos Saraus
de Livre Expressão Artística do Neelic.

CONTEÚDOS:
Aulas de expressão corporal; expressão vocal; improvisação; jogos dramáticos
e teatrais; atuação cênica; vivências coletivas com exercícios de teatro.
Aulas de História do Teatro Brasileiro e seminários teóricos sobre Nelson Rodrigues.

EXCLUSIVIDADES DO CURSO:
Material didático impresso e virtual gratuito;
Certificado de conclusão gratuito.

PROFESSORAS:
Desirée Pessoa (Atriz, Diretora e Pesquisadora Teatral, Mestra em 
Artes Cênicas da UFRGS, Professora de Teatro Licenciada UFRGS, Diretora 
do Grupo Neelic) e Vanda Bress (Atriz do Grupo Neelic e Oficineira de Teatro, 
Graduanda em Teatro pela UFRGS). 


COORDENAÇÃO:
Fabiana Montin (Atriz e Oficineira de Teatro do Neelic, Bacharel e
Licenciada em Filosofia PUCRS).

TURMA DISPONÍVEL:
Neste segundo semestre de 2012, haverá vagas apenas para uma turma, cujo horário
de aulas será:
Sábados, das 09h30min às 12h30min.

LOCAL DAS AULAS:
As aulas deste curso ocorrerão no HPSP. As entrevistas seletivas e inscrições
ocorrem na Usina do Gasômetro, e devem ser agendadas antecipadamente.

COMO SE INSCREVER:
Por e-mail ou telefone, através dos contatos do Neelic,
disponíveis no link Contato.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Notícia da Escola de Teatro: Estreia neste domingo o exercício cênico "O homem, a mulher e o barquinho"


Gente, estreia dos estudantes de nossa Escola de Teatro:

Criado para adultos e crianças, "O homem a mulher e o barquinho" é o exercício cênico de conclusão da turma do Curso de Formação de Atores da Escola de Teatro do Grupo Neelic, iniciada em 2011. A peça estreia neste domingo, 09 de setembro, e fica em cartaz até dia 30 de setembro, sempre aos domingos, às 16h, na Sala 505 da Usina do Gasômetro.

Na peça, um homem que deseja um barco para se lançar ao mar em busca do desconhecido vai até o rei de seu vilarejo para pedir que o governante lhe dê a embarcação. Por um período, o solicitante é considerado um sonhador e vira motivo de deboche público. Todavia, sua determinação e persistência fazem com que receba uma caravela, podendo assim, se preparar para realizar seus ideais. Enquanto se dedicava à conquista do transporte pelo qual havia ido batalhar, não percebeu, no entanto, que a faxineira do castelo havia se apaixonado por ele. Esta, tão determinada quanto o possível futuro marinheiro, sai atrás dele, em busca de uma nova vida.



A peça se concretiza sob o olhar do espectador de forma lúdica, lançando mão de elementos que primam pela extrema simplicidade e delicadeza de construção das imagens. Um misto de leveza e poesia de gestos e ações é o que encanta a ambos os públicos, adulto e infantil. O colorido de figurinos, luzes e elementos cênicos auxiliam na atmosfera que se estabelece, de um sonho possível. A trilha é executada ao vivo por Christiano Buys, que canta e toca violão. 

"O homem, a mulher e o barquinho" fará temporada aos domingos de 09 a 30 de setembro, às 16h, na Sala 505 da Usina do Gasômetro (5° andar). Os ingressos custam R$ 20,00. Estudantes, artistas e idosos têm 50% de desconto. Maiores informações: (51) 9274.9933, e-mail  escoladeteatrodogruponeelic@gmail.com ou site http://escolateatroneelic.blogspot.com.br/.


Ficha Técnica:

Orientação Cênica: Desirée Pessoa e Pablo Corroche
Elenco: Christiano Buys, Maristela Luz, Clarissa Siste, Ednilson Amaral.
Iluminação: Pablo Corroche
Trilha: Christiano Buys
Fotografia: Kiran León
Realização: Escola de Teatro do Grupo Neelic