Hoje passamos uma situação um tanto delicada no Neelic. Como forma de transmutar a energia, trazemos então um pouco de Tadeusz Kantor, artista que nos concede sentido à existência.
"O desmoronamento da moral burguesa do século XIX, quando somente os maiores talentos obtinham com muita dificuldade direito de cidadania, permite enfim ao ator chegar a uma posição social normal.
A revolução social dos anos vinte faz dele um trabalhador da cultura de vanguarda. São os anos em que o construtivismo, liberando a arte dos miasmas do idealismo, fascina o mundo por sua doutrina de uma arte concebida como fator de organização dinâmica da vida e da sociedade.
À medida que se desenvolve a civilização industrial e técnica, que a arte perde em numerosos países sua posição de vanguarda e seu dinamismo, o teatro transforma-se cada vez mais em uma instituição e o ator, por conseguinte, em funcionário a ela incorporado. Os direitos que havia obtido esfacelam-se ao contato com uma sociedade de consumo cujas idéias e existência estão fundamentadas sobre um pragmatismo radical, o culto da eficácia e um sentido de automatismo hostil a qualquer intervenção perturbadora da arte.
A assimilação a essa sociedade leva à surdez artística, à indiferença e ao conformismo.
Essa decadência é acelerada pela expansão dos meios de informação de massa: cinema, rádio, televisão.
Nesta etapa final reencontramos atitudes que têm estado sempre próximas uma da outra, a saber: o conformismo moral, uma indiferença absoluta quanto à evolução das formas e também a esclerose artística.
Uma certa laicização e a democratização do ator contribuíram para sua emancipação histórica, mas paradoxalmente tornaram-no medíocre.
A assimilação e a recuperação do artista e de sua arte pela sociedade de consumo encontram um exemplo típico no ator.
O ator-artista foi desarmado, aprisionado. Sua capacidade de resistência, tão importante para ele mesmo quanto para o papel que desempenha na sociedade, foi destruída, o que o leva a obedecer a todas as conveniências e leis que regem o bem-estar na sociedade de produção e de consumo, a perder sua independência, que é o que, colocando-o fora da comunidade, permite-lhe agir sobre ela.
A reforma do teatro e da arte do ator deve realizar-se em profundidade e tocar os fundamentos do ofício.
Durante um longo período de isolamento social, a atitude e a condição do ator carregaram a marca profunda de traços naturalmente saídos do mais secreto de seu psiquismo, que o distinguem da sociedade bem pensante e fazem nascer, por sua vez, formas autônomas de ação cênica."